quarta-feira, 8 de junho de 2011

Palestra sobre a Prevenção de Ruídos e Poluição Sonora em crianças e adolescentes.

Características do Ruído com Impacto na Saúde

Principio da Energia Equivalente − Intensidade e Duração
A forma afectiva como percepcionamos o som - com prazer ou sem ele - não está claramente associado a menor ou maior capacidade lesiva pelo que, na definição de ruído, entra-se principalmente com as variáveis intensidade e duração.
Ou seja, um som, mesmo que desagradável, se for pouco intenso e/ou pouco duradouro, não afectará a saúde. Em contrapartida, o hábito de ouvir a 8ª Sinfonia de Beethoven, a 120dB (grande intensidade) durante mais tempo que o devido, poderá provocar lesões auditivas irreversíveis. Para ter ideia da intensidade de alguns sons que nos rodeiam consulte a figura.
sons diferentes com energia equivalente
Intensidade
Duração
85 dB
8h
88 dB
4h
91 dB
2h
94 dB
1h
97 dB
30mn
100 dB
15mn
Sendo a capacidade nociva de um som função da intensidade e duração, é possível de forma matemática fazer equivaler a energia nociva de vários sons diferentes. A equivalência faz-se de forma simples pelo princípio do factor de duplicação dos 3 dB, por ex.: um som A embora tenha mais 3 dB que o som B, tem uma energia equivalente porque tem metade da duração. No quadro ao lado estão expostos vários sons com energia equivalente.
Segundo os documentos normativos em vigor, é obrigatório fazer pelo menos uma medição do ruído do local de trabalho quando é previsível este superar os 80dB(A).
O simbolo "(A)" nas referências à intensidade de um som equivalente significa que na medição deste som se dá mais ênfase às altas frequências, mais nocivas que as baixas frequências.
Recomenda-se que um trabalhador não deverá estar exposto a ruído contínuo equivalente superior a 85dB(A) durante 8h/dia de trabalho e é proibido estar sujeito a mais de 90 dB(A). A partir dos 85 dB(A) é também obrigatório fazer controlos do ruído anuais, um controlo audiométrico de 3 em 3 anos, munir os trabalhadores de meios de protecção individual (auscultadores ou tampões) e fazer formação aos mesmos trabalhadores.
A partir dos 90 dB(A) tanto os controlos do ruído como os controlos audiométricos passam a ser anuais e é obrigatório utilizar os meios de protecção individual e ter os locais devidamente sinalizados e com acesso limitado.
Por outro lado, para protecção da comunidade, não é permitido no exterior das empresas a existência em 95% do tempo de um diferencial superior a 10dB(A) , entre o nível do ruído perturbador provocado pela empresa (por ex., uma discoteca) e o nível do ruído de fundo, ou seja, o ruído existente no local e que não é imputável à empresa em causa.
Frequência e Padrão Intermitente do Som
As altas frequências dos sons agudos são mais nocivos que as baixas frequências dos graves. Aliás, o símbolo "(A)" nas referências à intensidade de um som equivalente - ex.:85dB(A) - significa que na medição deste som se dá mais ênfase às altas frequências, mais nocivas que as baixas frequências.
Por outro lado, o facto de a surdez na sua fase inicial aparecer em relação com os sons de maior frequência (à volta dos 4000Hz) julga-se estar relacionado com a maior capacidade lesiva dos "agudos".
Também a intermitência ou padrão impulsivo de um som é mais nocivo que um som contínuo de energia equivalente. Daí que o martelar ou o estampido de um tiro pode ter capacidade mais lesiva que o que seria de esperar pelo cálculo da sua energia equivalente. Assim, a nossa NP-1733 recomenda adicionar 10dB(A) a todos os níveis sonoros medidos nestas circunstâncias, embora os sonómetros integradores ou os dosímetros mais modernos façam já as medições e os cálculos da energia equivalente com os devidos ajustamentos.
É proibido expor os trabalhadores a ruídos impulsivos superiores a 140dB.

Efeitos Sobre a Saúde
O efeito mais conhecido é a surdez.
Quando a agressão não é demasiado intensa, a surdez corresponde apenas a perturbação funcional e é reversível. Por ex. a audição de um som de 90 dB durante 7 dias provoca surdez reversível durante cerca de uma semana e a audição de um som de 100 dB durante uma hora e meia provoca surdez reversível que leva cerca de oito horas a recuperar. Já a audição dos mesmos 100 dB durante 7 dias provoca uma pequena surdez permanente (pouco mais de 10 dB do zero audiométrico) correspondente a lesão orgânica das células ciliadas da cóclea.
O risco de surdez permanente obviamente varia de acordo com a intensidade e a duração da exposição que, segundo a Norma Portuguesa nº 1733 se distribui da seguinte forma:
Risco de Surdez Devido ao Ruído,  Por Anos de exposição(percentagem de indivíduos que adquirem surdez ≥ 25 dB)
Nível
Anos de Exposição
dB(A)
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
<80
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
85
0
1
3
5
6
7
8
9
10
7
90
0
4
10
14
16
16
18
20
21
15
95
0
7
17
24
28
29
31
32
29
23
100
0
12
29
37
42
43
44
44
41
33
105
0
18
42
53
58
60
62
61
54
41
110
0
26
55
71
78
78
77
72
62
45
115
0
36
71
83
87
84
81
75
64
47
Fonte: NP-1733    Nota: o facto de após muitos anos de exposição, o risco aparentemente diminuir, tem a ver com o ajustamento feito para a idade.
Os seres humanos, quando jovens ouvem sons num intervalo entre os 18 e os 20.000 Hz, embora as frequências mais importantes no relacionamento social sejam as relacionadas com a conversação, entre os 500 e os 2000 Hz, daí que a surdez mais incapacitante seja a que envolve estas últimas frequências.
Felizmente que a surdez devida ao ruído industrial inicia-se geralmente numa frequência ainda pouco incapacitante - 4000Hz - dando oportunidade, caso sejam feitas audiometrias periódicas, detectar os que vão desenvolver a surdez e tomar as devidas providências ainda numa fase não incapacitante.
Como se poderá verificar pela consulta do quadro em cima, nem todos ensurdecem quando sujeitos à mesma dose de ruído. A susceptibilidade ao ruído é efectivamente muito diferente de pessoa a pessoa. Actualmente, ainda não existe forma de diferenciar preditivamente os que são dos que não são susceptíveis. Isto, aliado ao facto de a hipoacúsia ter início nas frequências dos 4000 Hz e não ser percebida pelo próprio (atendendo estas frequências não serem utilizadas na conversação), faz com que as audiometrias periódicas sejam extremamente importantes para detectar ainda em fase inicial os mais susceptíveis ao ruído.
Como já foi referido, quando a surdez se alarga aos 3000, 2000, e sobretudo aos 1000 e 500Hz, torna-se impeditiva da normal comunicação oral. É por isso que a avaliação da incapacidade de uma hipoacúsia leva em consideração a surdez média aos 500, 1000, 2000 e 4000Hz com ponderação superior para os 1000Hz. Quando a surdez é classificada como de causa profissional é passível de várias formas de compensação, incluindo a compensação monetária a partir dos 35 dB.
A acompanhar a surdez existem geralmente zumbidos, atendendo a lesão ser neuro-sensitiva.
Existem ainda os conhecidos efeitos psicológicos, alguns inerentes à própria incomodidade do ruído (depressão, ansiedade, agitação e irritabilidade), outros como consequência da impossibilidade de comunicação social (incapacidade de aprendizagem da linguagem por parte da criança) e outros ainda por mecanismos mal conhecidos (por ex.: o ruído diurno altera a qualidade do sono nocturno). Estes efeitos são mais graves em pessoas já com debilidades psicológicas.
Finalmente, é conhecido o efeito hipertensor e taquicardizante do ruído devido à maior sensibilização às catecolaminas existentes. As consequências da hipertensão - hipertrofia e enfarte do miocárdio, acidente vascular cerebral, etc. - diminuem obviamente a esperança de vida.
Prevenção dos Efeitos Nocivos do Ruído em Saúde Ocupacional
O objectivo é diminuir a exposição para menos de 90 ou preferivelmente 85 dB/8h/dia útil. Geralmente a prevenção é feita tomando mais que uma medida:
Investimento em maquinaria moderna e o abandono da antiga;
Pequenas medidas de reparação e manutenção fazem por vezes milagres em máquinas ruidosas;
Instalação de barreiras de som ou de materiais absorventes de som (reduzem a ressonância);
Rotatividade dos trabalhadores nos locais mais ruidosos, para diminuir a dose de ruído equivalente por cada trabalhador;
Utilização de protectores auriculares (auscultadores ou tampões);
Avaliação periódica da dose de exposição e audiometrias.

António Paula Brito de Pina © Portal de Saúde Pública, 2000