Os PMs Luís Contieiro, Sônia Theodoro, Michel Fidêncio dos Santos e Júlio César da Silva no Colégio Estadual Dom Barreto (Foto: Augusto de Paiva/AAN)
Estimular a criação de líderes entre os adolescentes que possam ajudar a melhorar o ambiente escolar, reduzir a ocorrência de delitos e multiplicar o conceito de cidadania são algumas das metas de um programa desenvolvido pela Polícia Militar (PM) de Campinas há mais de três anos. O Jovens Construindo a Cidadania (JCC) tenta descobrir as lideranças positivas dentro das salas de aula e mostrar como, com ações práticas, pode-se transmitir melhor o conceito de cidadania para aqueles que serão os adultos de amanhã.
Somente no 35º Batalhão da PM, quatro policiais atuam como agentes orientadores de aproximadamente 400 jovens, de 11 a 18 anos, em oito instituições de ensino estaduais do município. Os PMs realizam reuniões semanais dentro das escolas com representantes das classes da 7ª série do Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Médio. Nesses encontros com as lideranças dos estudantes, os orientadores levantam questionamentos sobre os seus problemas no dia a dia dentro e fora dos portões da escola e sobre temas do interesse da juventude, como meio ambiente, vandalismo, drogas, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), tecnologia, saúde e sexualidade.
A partir da identificação das necessidades de cada grupo, os policiais estimulam os debates e oferecem os meios para que as ideias possam ser colocadas em prática. Um exemplo foi o que aconteceu com os estudantes da Escola Estadual Dr. Disnei Francisco Scornaienchi, do Parque Jambeiro, que decidiram se mobilizar e angariar roupas para a instituição Toca de Assis, que presta atendimento a moradores de rua na Vila Industrial. Na semana passada, um grupo de cerca de 20 jovens, sob a coordenação do soldado Michel Fidêncio dos Santos, organizou uma visita à entidade para conhecer o trabalho realizado e entregar as 170 peças arrecadadas. “Problemas existem, mas todos são capazes de mudar”, afirma Fidêncio. “A grande vantagem é que o JCC é um programa muito dinâmico, que nos dá liberdade de trabalhar com os jovens em busca dessas mudanças.”
Na Escola Estadual Dom Barreto, na Vila Industrial, a sargento Sônia Theodoro trabalha deste o começo do ano com um grupo de 40 estudantes do projeto. Como os alunos que decidem participar do JCC são voluntários, o processo inicial de formação da turma com os representantes das classes é um pouco lento, mas o grupo vai se estruturando, elegendo o presidente e, automaticamente, aqueles que não despertam interesse acabam se desligando.
Bruno Romanholi tem 17 anos e cursa o 3º ano do Ensino Médio na Dom Barreto. Para ele, que estuda desde a 1ª série do Ensino Fundamental nessa escola, as dificuldades cotidianas já são bem conhecidas e discutir em grupo como resolvê-las, sob a orientação de alguém mais experiente, facilita o trabalho. “No começo, é importante ter alguém de fora orientando porque, se estamos sozinhos, nos falta a liderança. Além do quê é importante estabelecer algumas regras para que os projetos possam prosseguir”, destaca Bruno.
Em meio ao crescimento da epidemia da gripe A (H1N1), o grupo do JCC está considerando a possibilidade de trazer algum profissional da área da saúde para dar uma palestra na escola sobre a doença e as melhores formas de se evitá-la. Outras questões práticas para aprimorar o funcionamento da escola e reduzir o vandalismo também são tema das conversas, tais como melhorar a sala de informática e a biblioteca, instalar cortinas em salas de aula ou evitar que estudantes de fora pulem os muros para jogar bola na quadra. “Tudo o que a gente faz é para a melhoria da escola, para que os alunos possam estudar mais e melhor”, explica Andressa Silveira, de 15 anos e frequentadora do 1º ano na Dom Barreto. Transmissão de valores
A partir do momento em que o Jovens Construindo a Cidadania é adotado pela escola, a meta é que o grupo se perpetue e que os representantes de classe possam passar os conceitos aprendidos para seus colegas. À medida que os mais velhos vão deixando a instituição ao se formar, novas vagas são abertas para as séries iniciais e o grupo se fortalece. Muitas vezes, para conseguir pôr em prática alguma ação cidadã programada, o JCC precisa contar com o apoio de empresas privadas, por exemplo, para a confecção de camisetas e cartazes empregados em alguma campanha de esclarecimento.
Segundo o major Benedito Costa Júnior, comandante do 35º Batalhão, a intenção é de que o programa possa ser levado a todas as escolas da rede pública, como acontece com o Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (Proerd) — outro projeto social desenvolvido pela PM —, e também para instituições privadas. “O JCC é um pouco mais demorado porque é um trabalho de conscientização dos jovens, em que vamos para uma escola e sedimentamos o projeto lá.”
- O leque de atividades vai desde ações simples, como um mutirão para trocar as lâmpadas queimadas da escola ou limpar todas as carteiras com buchas e detergente até trabalhos mais complexos que envolvem a conscientização sobre os malefícios do consumo de álcool e drogas. “Nos locais em que eu trabalho, tento sempre respeitar o clima existente. Para mim tem sido uma grande experiência. Às vezes, me questiono se o grupo vai conseguir se unir, mas depois sempre percebemos um grande resultado no comportamento dos alunos”, diz o soldado Luís Gustavo Contieiro, referindo-se aos problemas com delinquência e criminalidade encontrados em algumas instituições.
- O leque de atividades vai desde ações simples, como um mutirão para trocar as lâmpadas queimadas da escola ou limpar todas as carteiras com buchas e detergente até trabalhos mais complexos que envolvem a conscientização sobre os malefícios do consumo de álcool e drogas. “Nos locais em que eu trabalho, tento sempre respeitar o clima existente. Para mim tem sido uma grande experiência. Às vezes, me questiono se o grupo vai conseguir se unir, mas depois sempre percebemos um grande resultado no comportamento dos alunos”, diz o soldado Luís Gustavo Contieiro, referindo-se aos problemas com delinquência e criminalidade encontrados em algumas instituições.
Programa nasceu há 30 anos nos EUA
A proposta de resgate dos valores de cidadania que vem sendo apresentada pelo Jovens Construindo a Cidadania dentro do ambiente escolar de Campinas é originária dos Estados Unidos. O projeto experimental começou na Flórida, em 1979, com o nome de Youth Crime Watch e nasceu da necessidade de se combater o avanço das drogas e da violência na comunidade adolescente. Com os resultados positivos obtidos, a ideia foi institucionalizada com a criação de uma entidade nacional, em 1986, o Youth Crime Watch of America.
O JCC é a versão brasileira do programa norte-americano, que já está presente, há dez anos, em várias partes de São Paulo e também em outros estados brasileiros, como Minas Gerais. Em Campinas, a iniciativa já foi implantada pelos três batalhões da Polícia Militar em diversas escolas. Ao transmitir os valores positivos para os estudantes, os próprios policiais buscam superar a imagem de distanciamento da comunidade pela atividade de repressão ao crime. Para participar do programa, os policiais precisam passar por um curso de capacitação que os habilita a desenvolver as atividades em sala de aula, aprendendo a trabalhar com conflitos e com a diversidade.
Depois, no decorrer do ano letivo com os alunos, os militares se reúnem semanalmente para avaliar o andamento do programa e trocar ideias sobre as experiências implantadas nas diversas instituições de ensino da cidade.
Fonte: Correio Popular - 09/09/2009